Esta série de artigos trata do assunto abordado por mim em minha monografia, a qual foi apresentada como exigência do curso de teologia da FATE-BH em 2008. Aqui, procurei, de forma simples e rica, propagar a minha idéia sobre o que seja religião e salvação cristã sem se afastar demais do que foi escrito na monografia. Portanto estes artigos terão uma linguagem simplificada sobre o assunto. Caso queira uma leitura mais científica aconselho ler minha monografia, que pode ser baixada na íntegra no link que segue no final deste artigo.
Nas partes anteriores apresentadas foi demonstrado como se deu a evolução do termo "religião" durantes a história e como que o cristianismo se apossou do termo, ao mesmo tempo que o próprio cristianismo se encontrava e encontra em desenvolvimento enquanto religião. Apesar deste resumo da minha monografia não ser exaustivo em sua proposta, o objetivo maior é deixar claro que o cristianismo não pode ser considerado detentor da salvação emuito menos uma religião divina. Na parte 2 deste resumo ficou claro que o cristianismo, em seu desenvolvimento, sempre buscou responder as questões sobre a realidade, mas nunca pode ditar a realidade. E pelo fato de o cristianismo tentar uma adaptação de si na realidade deixa claro sua iminente evolução enquanto religião. O fato de o cristianismo não ser detentor da salvação não o isenta de ser participante da salvação.
O problema maior que se tem, no âmbito soteriológico cristão atual, é o fato de o cristão achar que o cristianismo salva. Na parte 2 do resumo ficou claro o nascimento deste problema: No cristianismo antigo era Jesus quem salvava; no cristianismo medieval era Jesus Cristo, tendo a Igreja Católica como mediadora, quem salvava; e atualmente, após o surgimento e retorno de centenas de religiões, nada mais natural para acontecer do que a crença de que "minha religião é a certa". A proposta da monografia é combater essa espécie de "religiocentrismo" (esse termo foi inventado por mim), onde uma religião em particular vale mais do que as gerais.
Nesta 3ª parte a proposta é mostrar que tanto o cristianismo quanto as demais religiões têm, cada uma na sua devida proporção, conceitos verdadeiros e intenções reais sobre a salvação do homem. Neste quesito o cristianismo se torna mais uma religião. E é daí que surge a pergunta: "Mas por que ser cristão?" "Se o cristianismo não é 'a religião' conclui-se que posso seguir qualquer uma?" É essas e outras perguntas que serão tratadas nesta parte do resumo.
Salvação e religião: Contribuição para o diálogo inter-religioso
Religião não é algo que se cria e se fala apenas. Não é algo vazio ou que apenas se sonha. Religião é algo o qual se vive.1 Sabe-se que religião é algo que se fala a partir de experimentações do divino; oculto e sobrenatural. Logo, são conceitos, teses e crenças, as quais levam o ser humano a algo inimaginável contudo convidativo; leva o homem à esperança contra a morte acima de tudo. Mais especificamente sobre o cristianismo, este é uma religião que tem como objetivo o estabelecimento do Reino de Deus e seu domínio eterno onde o mal ão mais terá domínio sobre a criação de Deus.2
Também é fato que o cristianismo caminha graças às suas elaborações teológicas adiquiridas através da história. Fato este que deixa claro que o cristianismo possui uma filosofia totalmente antropocêntrica (homem como centro de tudo) somado à influência de outras religiões. Mas ainda assim o cristianismo continua único; diferente de qualquer religião. Logo, o cristianismo nasceu e cresceu diante do diálogo com todos e tudo que estava ao seu redor. Sua existência veio graças a esse diálogo.
Nos dias de hoje, muitas religiões se interpretam como fundadas por Deus e somente por ele. O cristianismo também se inclui nesta lista. Mas isso é uma afirmativa errônea. Toda religião nasce de uma ação simultânea: A sede do homem associada à revelação de Deus. O envolvimento homem/Deus faz com que uma interpretação surja. E essa interpretação é passada de pessoa a pessoa, de forma certa ou errada é acreditada e assim pregada como também vivida.
A religião, a grosso modo, é uma luta contra o mal. Mais especificamente a morte, torna-se o tormento do qual o homem sonha ser livre ou pelo menos vitorioso. No cristianismo a salvação não se dá apenas pelo homem, mas na ação homem/Deus. Segundo o cristianismo, Deus interfere na maldade humana com indícios de salvação, salvação esta que culminará em salvação plena com o Reino de Deus devidamente estabelecido.3
A salvação, por ser esta uma luta contra a morte e a busca por esperança, deixa claro que pode ser vivida. O sonho de algo além da vida vem como apêndice de lgo que experimentado no hoje. O fato de se ter sonhado com algo inefável demonstra que o contato com algo foi iminente, portanto vivenciado e possível ao hoje. Logo religião é a interação do homem/Deus (sede + Revelação); juntamente com a luta contra o mal e favor do bem buscando o clímax do bem, que segundo o cristianismo é o reino de Deus devidamente estabelecido.4
Salvação como dimensão divina e humana
Segundo Wolfhart Pannenberg, teólogo alemão do século XX, a teologia é uma ciência. E esta, assim como as demais ciências, está em busca da verdade, sujeita às mesmas condições. Pannenberg afirma que a teologia é provisional assim como todas as ciências, o que leva a conclusão de que não se pode embalar em fórmulas as verdades sobre Deus.5 Pannenberg coaduna com a suma de Agostinho de que a verdade não é de ninguém para que esta seja de todas. Isso salienta a idéia de que religião é a decodificação do que se aprendeu durante a vida na busca pela transcendência.6
Nessa interligação entre Deus e homem se torna comum as expressões de fé, que na verdade são decodificações do que se aprende e apreende do relacioamento com o sagrado. Ou seja: O homem, na medida em que apreende o sagrado, o traduz para a linguagem de sua realidade, dando sentido e cor à sua leitura. Isso vale para todas as religiões, todavia, no cristianismo, isso é possível somente pela fé. A fé, segundo o cristianismo, é a convicção firmada daquilo que se especula; é a certeza dquilo que ainda não é comprovado por faculdades humanas. Ora, a fé não é uma faculdade humana, mas humana/divina, já que esta interliga um ao outro.
No cristianismo, a codificação do sagrado se dá por meio da fé. Mas tal fé não está ligada a um sistema de regras ou de sistemáticas, mas em Jesus de Nazaré, do qual nasceu a religião cristã. É em Jesus que se encontra a fé do homem com Deus; a ligação homem/Deus.
Uma conclusão não muito aceitável no geral (fora da monografia)
Contudo ficou claro que a religião, no geral, pode se achegar a Deus. Até mesmo um não-cristão se achega a Deus, já que Deus não se encontra preso a dogmas, sitemáticas e religiões, mas ao amor à sua criação. E talvez por isso surja a pergunta: "Qualquer religião é válida?" A resposta é sim quando esta é vivida pelo adepto de toda a alma; a resposta é sim quando a verdade sobrepuja o ser humano; quando a verdade é livre e não-algemada. Entretanto a resposta é não quando o adepto é mero seguidor; simples anunciador; não-vivenciador da experiência de salvação; mais conhecido como "Maria vai com as outras". A verdade do Evangelho, assim como eu creio, é maior que as formulações, entretanto confirmas as formulações humanas ssobre o divino. Eu creio no Evangelho de Cristo, e este é o decodificador da vida, prém falo de Cristo, o Senhor.
É diante da pergunta "toda religião é válida?" quem vem a prova da verdadeira fé cristã: Ser judeu como Jesus e, como este, não atentar às regras judaicas, mas ao que a regra divina pleiteia: Ao homem, e este para o Bem. Jesus, não se importando por ser judeu, conversou com uma samaritana, tocou em morto quando a Lei judaica diz que não deve, perdoou quando não devia perdoar segundo a Lei, enfim, Jesus seguiu a verdadeira religião: Adotar a verdade como maior a si mesmo, mesmo sendo um judeu. As regras judaicas não foram maiores que a Verdade. Assim também deve ser no cristianismo. Nas palavras de Smith: "A teologia faz parte das tradições, faz parte deste mundo. A fé está além da teologia; ela está no coração das pessoas. A verdade está além da fé; ela está no coração de Deus".
Ser cristão não é seguir o cristianismo e suas regras, é ser do cristianismo com a fé de Jesus. Não é se rebelar com o cristianismo, mas confirmá-lo como conclusão de um grupo de pessoas que querem a salvação. Não cabe aqui ter a fé em Jesus, mas segundo Jesus, deve-se ter a fé dele. Se a fé cristã está certa em dizer que só Jesus salva, não será uma religião dita pagã, mas que tem a fé de Jesus, que irá para o inferno. Caso contrário negamos as palavras de Jesus em Mt 25.31-46. Desfecha-se aqui com as palavras de Küng: "A fé de Jesus une-nos, mas a fé em Jesus sepára-nos".7
Para ler a PARTE 1/3 clique aqui.
Para ler a PARTE 2/3 clique aqui.
Se tem dúvidas sobre o que é ser cristão leia mais sobre isso clicando aqui.
Gostaria de lembrar que este artigo é um simples resumo de minha pesquisa monográfica, a qual foi apresentada como exigência do curso de teologia da FATE-BH em 2008. Caso queira lê-la integral e gratuitamente baixe-a clicando aqui.
Referências das Citações:
1- Cf. REIS, 1965, p.101.
2- Baseado nos ensinos do Apóstolo Paulo em 1Co 15. Ver também KÜNG, 1976, p.353-354.
3- Cf. TILLICH, 1967, p.150-151, 185-193, 224-226, 240-246; BERKHOF, 1992, p.190-193; GAARDER, 2000, p.185-188; CAIRNS, 2005, p.244-245 e LUTERO, 2006, p.121-131.
4- Cf. GRENZ, 1988, p.795-796.
5- Ibidem, p.795.
6- Ibidem, p.795.
7- Cf. KÜNG, 1976, p.146.
BIBLIOGRAFIA:
BERKHOF, Louis. A história das doutrinas cristãs. São Paulo: Editora PES, 1992.
BÍBLIA Sagrada Nova Versão Internacional. São Paulo: Vida, 2000.
CAIRNS, Earle. O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 2005.
GAARDER, Jonstein; NOTAKER, Henry; HELLERN, Victor. O livro das Religiões. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
GRENZ, Stanley. Wolfhart Pannenberg’s quest for ultimate truth. The Christian Century, September 14-21, 1988.
______The irrelevancy of theology: Pannenberg and the quest for truth. Calvin Theological Journal 27, November, 1992.
KÜNG, Hans. Ser Cristão. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
LUTERO, Martinho. O cativeiro babilônico da Igreja.São Paulo: Martin Claret, 2006.
REIS, Manuel da Encarnação. O cristão no mundo hoje. ?: Livraria Morais Editora, 1965.
SMITH, Wilfred Cantwell. O sentido e o fim da religião. São Leopoldo: Sinodal, 2006.
TILLICH, Paul. História do pensamento cristão. São Paulo: ASTE, 1967.
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