sábado, 27 de fevereiro de 2010

Correntes teológicas do século XIX: O desespero e a existência segundo Kierkegaard (Uma apreciação crítica)

Por Carlos Chagas

Segundo o filósofo Kierkegaard, todos os seres humanos foram feitos de uma mistura finita com a infinita. Tal mistura pode ser entendida melhor quando se compreende o homem à imagem e semelhança de Deus. Kierkegaard afirma que o homem foi feito para viver seu início e final no e com o Eterno. Tais homens que queiram viver longe desta verdade se colocam em situação de risco chamada por Kierkegaard de desespero. Kierkegaard afirma que o homem que descobre que ainda não é pleno em si próprio tem a grande chance de se descobrir e de viver segundo os planos divinos. Aqui já se tem meio caminho andado, uma vez que é melhor para o homem se ver no desespero do que negar tal realidade.

Mas o desespero não se dá simplesmente com relação a algo. Para Kierkegaard o verdadeiro desespero se dá quando o indivíduo se desespera consigo próprio; quando se vê em crise com o seu “eu”. Porém, para Kierkegaard esse estágio possui um perigo, que é de o indivíduo criar para si um “eu” que não é na realidade o “eu” perfeito para si. Isso o leva a viver uma fantasia. Kierkegaard diz que “o desespero da infinitude se manifesta na fantasia”.

Segundo a afirmação de Kierkegaard percebe-se que ele critica a criação de uma fantasia, o que pode ser entendido claramente, uma vez que o indivíduo estará vivendo uma realidade que não é a sua. Porém, se isto for analisado por outro ângulo, será visto que esta negação da fantasia, quando levada ao extremo, pode fazer com que o indivíduo venha a sofrer muitos problemas. Se for observado um homem que adora uma imagem ou algo que não é da realidade divina, será notado que ele, o indivíduo, vive uma fantasia, ou seja, aquela imagem ou aquilo que ele adora é o Deus dele. É notável que ele vive uma farsa. Porém, o homem foi feito para adorar algo, que é Deus. Se o homem não o conhece, ele adorará algo que não é Deus. Cria-se uma fantasia. Esta é ruim. Mas se tirada do homem, este se encontrará em uma situação pior que a primeira. Em todas as culturas é perceptível a adoração a deus ou deuses de diversas formas pelo indivíduo. Mas o interessante disso tudo é o seguinte: A fantasia não é algo bom em si, uma vez que restringe a verdade ao indivíduo. A fantasia deve ser vivida pelo indivíduo, mas ela deve ser transcendida. O homem não é perfeito, pois se o fosse este não pecaria contra o Criador; e nem imperfeito, porque senão não poderia ser negada uma imperfeição por parte do Criador. O homem é aperfeiçoável. Este tinha a Liberdade no Éden, perdeu, e agora luta consigo mesmo para voltar ao primeiro estágio. Suas veredas são endireitadas conforme sua caminhada.

Segundo Kierkegaard, o desespero não é alcançado apenas. O indivíduo, quando entra em desespero, ele ultrapassa o próprio desespero porque agora ele entende que ele não é aquilo que ele achava que era. Seu conhecimento de tal estágio faz com que lute para alcançar uma verdade válida e, se possível, universal. Mas por que universal? Porque a fantasia que ele vivia era relativa; só valia para si. Quando o indivíduo descobre que ele é fruto de algo Único (do próprio Deus), ele passa a ver tudo como fruto de algo único e imutável. Por isso universal.

Não só este tema sobre desespero, mas outros de Kierkegaard foram e é crucial para entender a existência do ser humano e de tudo que há na terra. Para entender o mundo devemos compreender nós mesmos primeiro. Não se compreende o mundo se não compreendemos o mundo que está dentro de nós. Talvez fosse isto que ardia no coração de Kierkegaard e em seus estudos.

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