Por: Carlos Chagas e Pablo Souza
Resumo
O objetivo deste artigo é reorientar a proposta de vida presente no mundo pós-moderno. Pelo fato de o homem pós-moderno já não mais ter referencial coerente para se viver e de este ser fruto de um sonho frustrado da modernidade, a mensagem da Cruz e da Graça se faz presente e necessária na vida deste ser. A identidade humana, uma vez perdida na Queda e deturpada na modernidade, agora é resgatada e relida por este homem buscando aquilo que é de valor essencial para todo ser: como viver e ser enquanto ser criado.
Palavras-chave: Modernidade, pós-modernidade, humano, Cruz, Graça, Deus, ser e humanização.
Introdução
Todo ser enquanto existente se pergunta em como se viver em sua época, o que não é diferente ao ser humano pós-moderno. Este, afetado pelo pensamento moderno, passa então a viver a vida proposta pela modernidade que é pura e simplesmente autônoma, livre e extremamente racional. Porém, ao se viver tais propostas, a humanidade passa a ter comportamentos de dúvidas e incertezas, medo, ansiedade e depressão. Indícios de loucura e descentralização do ser passam a ser notórios na vida deste.
Portanto, o que se vê é um constante distanciar deste homem para com Deus. Ao acontecer isso, o homem perde sua essência de viver e de ser, já que este foi criado à imagem e semelhança de Deus. A modernidade já não tem mais seu ápice de influência e com isso o referencial da humanidade passa a ser o seu próprio desespero. Logo, a pós-modernidade adota características variadas e desconectas entre si.
Por isso, termos como Cruz e Graça carecem de uma re-interpretação, já que estes não dão mais respostas à pós-modernidade. Ambos são na vida humana algo de extremo valor e de identificação existencial. O Deus que se fez homem, que viveu a Cruz e derramou a Graça não tem mais a valorização por parte desta época pós-moderna. A secularização torna-se efetiva, mas o homem ainda permanece como criatura de Deus, e assim é obrigado a refletir na mensagem da Cruz e da Graça em sua vida. Por isso, o homem só tem valor humano quando se encontra intimamente ligado com estes dois marcos da vida cristã, ou melhor, da vida de todo ser.
Da modernidade para a pós-modernidade
Tema muito falado nos dias de hoje é “pós-modernidade”. Pós-modernidade é um título que se dá para a forma de pensamento contemporâneo que vai além do pensamento moderno (Ao se consultar o dicionário Aurélio percebe-se que as características que definem a pós-modernidade são contrastantes com a realidade proposta pela modernidade). Para se entender, na integra, a pós-modernidade, opta-se por fazer aqui uma breve introdução sobre a modernidade. O pensamento moderno teve suas origens no Renascimento (Embora alguns historiadores considerem o seu surgimento após a Guerra dos 30 anos. Cf. GRENZ, Stanley J. 1997. p. 17), porém, não tendo este como responsável pela sua superestrutura (Cf. GRENZ, 1997, p.96), onde os pensadores, que iam contra o pensamento teocêntrico da época, passaram a considerar o homem como o centro de tudo (antropocentrismo). Ainda no Renascimento, o homem passou a valorizar artes, escritos que eram proibidos pela igreja, arquiteturas, pinturas, esculturas, e tudo o mais que enfatizasse a figura humana (Cf. GOMES; MOURA; GONZÁLEZ, 1969, p.118-120). Isso fez com que o espírito de busca da época ficasse aguçado a novas pesquisas, já que antigamente isso não era possível.
Devido à valorização da Natureza, onde o transcendente não era mais interessante e alvo de atenções, o homem passou a buscar, através de experimentações e observações da mesma, respostas às dúvidas dos problemas científicos pelo fato de ter sido deixado de lado as explicações de ordem religiosa (Cf. GOMES; MOURA; GONZÁLEZ, 1969, p.121). Esse é o grande passo da modernidade. A partir daí, a busca pelo “certo e errado” substituiu o “verdadeiro e falso” (“Certo e errado” dão mais precisão às buscas, uma vez que “o verdadeiro e falso” não têm precisão matemática. Já que a modernidade se inclinou à pesquisa natural, essa deveria ser mais precisa possível em suas buscas devido ao fato de a Igreja, na Idade Média, colocar o inexplicável no campo místico/transcendente, o que enfatizava uma certa subjetividade por parte das interpretações), sempre buscando ser o mais objetivo possível em tudo o quanto for produzido. Conseqüentemente, devido a essa precisão, a matemática e a filosofia surgem como norteadores dos pensamentos. A modernidade caminhou com esse raciocínio até o ponto de considerar a razão como o único meio de entender a realidade que circunda o ser humano. É daqui que virá o protesto pós-moderno contra a modernidade (Alguns pensadores consideram a pós-modernidade como a modernidade tardia), entendendo que a modernidade não conseguirá explicar tudo de forma objetiva. Aliás, o que ela consegue fazer é simplesmente ampliar o raciocínio para o diversificado, o que é característica principal da pós-modernidade (Cf. GRENZ, 1997, p.24-25).
Outro marco do fim hegemônico da modernidade são as duas grandes guerras mundiais. Estas serviram para mostrar ao homem moderno que todo o seu esforço em buscar o progresso (Esse é um dos cinco princípios do Iluminismo, o qual se encontra na era moderna. São eles: (1) Compreender o mundo pela razão; (2) dominar as leis próprias da natureza; (3) ao se compreender a natureza o homem se fará autônomo; (4) idéia de ordem e moderação do universo através da harmonia; e (5) o progresso como resultado dos quatro primeiros princípios) serviu somente para a destruição de muitos. As Guerras foram um golpe contra a vontade ergonômica (Entende-se por ergonomia como processo de adaptação e adequação do homem ao meio de trabalho e de ação do mesmo) do homem moderno. Foi com o acontecimento das Guerras que a pós-modernidade tomou força.
O fim da modernidade trouxe uma mudança ampla na vida das pessoas. Após ser descoberto que a definição de algo pode muito bem ser uma manifestação da vontade individual de alguém, ou uma imposição do poder pela convenção (Síntese simplificada do pensamento de Nietzsche. Para acesso a ele Cf. GRENZ, 1997, p.133), a valorização da emoção e da intuição, que leva à diversidade, à realidade indeterminada e à participação passaram a ser o que é de maior valor para a pós-modernidade, porque a razão já não mais é considerada como o único meio de se alcançar a verdade (Cf. GRENZ, 1997, p.24-25).
É aqui que o artigo toma seu foco: Como fica o Cristianismo diante de tal realidade? E o ser humano na pós-modernidade? Como ele está sendo orientado conforme a realidade proposta para si? Teria o Cristianismo e o homem os mesmos conceitos anteriores à modernidade? A pós-modernidade vê Deus com o mesmo olhar de antes? Essas perguntas pertinentes que se tornam relevantes a qualquer cristão que leva a sério o Evangelho e seu próximo.
O Cristianismo e Deus na pós-modernidade
Após as grandes guerras dúvidas pairavam sobre os contemporâneos das mesmas. Isso se dá pelo fato de a modernidade ter conceituado que Deus é um ser (ou algo) que espera de sua criação nada mais que o progresso e o bem. Mas a grandes guerras mostraram algo diferente. Movidos pela ganância e por interesses econômicos, França e Alemanha envolvem-se em conflitos entre si jogando por terra o ideal moderno (Cf. GOMES; MOURA; GONZÁLEZ, 1969. p.177). Se Deus era um ser que simplesmente “deu corda no mundo, assim como se faz no relógio, e depois foi embora” (Idéia predominante na modernidade), o que alimenta a idéia de um Deus distante, mais a idéia de distância ganha força na pós-modernidade. E o Cristianismo, que influenciou fortemente toda a ação cultural, social, econômica, religiosa, e em parte, ideológica na Europa desde o séc IV até o séc XVII (Cf. CAIRNS, 1984) perde seu trono para a individualidade de crenças do povo. Deus, que era cristão, deixa de ser para se tornar diverso, “multi-conceitual”, relativo. O Cristianismo perde suas forças de persuasão e seu sistema dogmático entra em crise.
Enquanto o Cristianismo busca uma explicação coerente em suas doutrinas para a época atual (séc XX e XXI), o mundo se “delicia” da diversidade de pensamentos religiosos e de sumas culturais. O relativo toma conta dos pensamentos e das idéias do homem até onde convém. Daí outra indagação: Como o homem se relaciona e é tratado diante deste sistema? O que de fato é experimentado pelo homem hoje?
O homem após o séc XIX
A sociedade pós-moderna que “valoriza o lucro pela exploração, o consumo desenfreado e o prazer de viver sem compromisso com o outro. As injustiças sociais, a violenta exploração do ser humano, a discriminação racial e sexual, e hierarquia de classes, o individualismo, o espírito materialista” (PAULINO, I. R. Prática da justiça divina: fermento de uma nova qualidade humana. In: PELLÁ, Ângelo Virgílio. Tendas e Tabernáculos: Religião e pós-modernidade. São Paulo: Paulinas, 2006. p.77-78.) coloca-se como solucionadora dos problemas da modernidade. Se na modernidade o homem foi valorizado somente em tese, na pós-modernidade este mesmo homem não tem valor algum a não ser de se tornar aquele que vivencia a “cultura do mercado e da mercadoria” (PELLÁ, 2006, p.78). O homem, na modernidade, era valorizado como um ser maior que os demais, porém hoje, o homem é tratado como a escória, não em textos ou livros, mas em sua ação social, no emprego e na sociedade. A globalização pós-moderna tem efeito de exclusão (PELLÁ, 2006, p.78).
O ter é mais importante que ser. Isso se comprova observando: o capitalismo americano; o mercado de trabalho onde ter diplomas é melhor que saber fazer; as igrejas onde ter enorme quantidade de membros é o certo; a hierarquia social, na qual quem não é de destaque é alvo da injustiça social; e outros. Com isso o homem já não mais pode se ver como uma pessoa; como um ser existente, mas como um produto do seu meio.
O homem pós-moderno se vê em situação desumana quando se trata do social. Para se ter valor na sociedade (Referindo-se à sociedade urbana de cunho ocidental) o homem precisa negar seus valores pessoais e às vezes até mesmo sua identidade. Isso, quando se alcançam devidas proporções, faz com que igrejas, consultórios psicológicos, núcleos de convivência, fiquem bem freqüentados. É a necessidade de suprir suas carências de saúde, alimentação, emprego, proteção, afeto, que fazem acontecer uma imensa corrida por alívio imediato, ainda que momentâneo e precário, na dimensão religiosa (PELLÁ, 2006, p.28-29).
Delimitando estes problemas sociais, no âmbito eclesial, o que de fato permanece é que a igreja não consegue responder às carências do povo, uma vez que estes problemas são de cunho holístico. Por isso, grande parte do discurso soteriológico da igreja é dualista, ou seja, a alma é que se salva. Isso se dá pela impotência da igreja diante de tal situação.
Não é só pela questão da dualidade e nem da ineficácia da igreja na pós-modernidade, mas pelo fato de os cultos e missas superlotadas acontecerem naturalmente, o relacionamento interpessoal fica debilitado. E isso não acontece somente na igreja. Até mesmo em uma empresa o relacionamento amigável entre os funcionários ficou mais próximo da extinção. Isso se torna pior quando a distribuição de renda é desigual fazendo com que duas vertente tomem seus lugares: ou se trabalha exageradamente para suprir a carência em voga, fazendo com que laços de amizade fiquem em segundo plano na empresa; ou se torne mais um marginalizado (Cf. GOMES; MOURA; GONZÁLEZ, 1969.p.236-237).
Por fim percebe-se uma elevação do homem além de seus limites, o que o desumaniza. A busca por Deus, que é totalmente e tão somente imanente, como é experimentado por algumas igrejas, faz com que o homem viva do êxtase e do instante. O valor da religião resume-se na experiência mística imanente (Cf. PELLÁ, 2006, p.81). O Deus que é transcendente/imanente passa a ser, ou um, ou outro. A relação do homem com Deus não passa de tão somente “envolvimentos extáticos”, ou de relações de troca, já que é assim a realidade vivida por este homem (Cf. PELLÁ, 2006, p.74). O que cabe aqui então é ter uma nova concepção do Deus que é imanente, mas também transcendente, mostrando que a desencarnação do transcendente, deixando-o apenas um ser imanente, faz com que a vida não gire mais Nele, e como conseqüência, o Deus que é ilimitado passe a ser limitado e conivente com os problemas humanos.
A mensagem da cruz e a mensagem da Graça
Parte-se aqui do pressuposto de que o homem não pode pensar em uma vida divorciada de Deus, já que esse, apesar de ser autônomo em muita das suas ações, não tem a capacidade de dar a vida e muito menos de conceder a alguém graça. A modernidade caminhou tentando provar a auto-suficiência do homem, mas sua própria forma de lidar com a vida provou ser impossível apreende-la. Por isso, apesar de teorias estarem em voga (Por exemplo, Evolucionismo e Criacionismo), Cáio Fábio vai dizer que “o ser humano só pode Ser quando estiver descansado naquele que é o Eu Sou”.
Por isso, Cruz e Graça são elementos importantes para se entender o sentido de ser humano. Paulo vai dizer, em sua carta ao Coríntios (1 Co 1:18ss), que a mensagem da cruz é uma ação que contrasta a sabedoria do homem que se perde, enquanto para os que são salvos se revela como poder de Deus. A problemática moderna girou em tentar pôr padrões divinos e deificados, que são paradoxais à vida humana, nos padrões normais da vida cotidiana. O maior paradoxo defendido pelos cristãos é o fato de Deus ter morrido na cruz (Tema trabalhado no livro El Dios crucificado de Moltmann) impulsionando o homem a uma libertação dos poderes cósmicos que afastam o mesmo da realidade de Deus. O que para os judeus é um escândalo e para os gregos é loucura, para os crentes, também chamados de salvos, é poder de Deus para liberdade. A liberdade foi entendida pela modernidade como algo solto e autônomo, o que pode levar a uma libertinagem, já condenada pela Bíblia. Por isso, a liberdade deve ser entendida como algo “livre nas amarras de Deus e de suas leis” (Interpretação baseada no livro de GIBELLINI. p. 88-92). O paradoxo da liberdade do homem em Deus e em “suas amarras” está na cruz de Cristo. Este morreu crucificado, sendo tratado como maldito de Deus pelo fato de a cruz retratar maldição (Gl 3.13) naquela época. Porém, Cristo optou por viver diante de Deus inculpável, o que o fez justificado, pelo fato de ser esta a vontade do Pai. Essa mesma cruz que expunha a alguns como malditos também manifestava a Graça inefável de Deus Pai, graça essa que não é apenas um favor imerecido (Conceito comumente aceito na comunidade de Fé), mas que representa uma aproximação do homem com Deus, homem esse que, pelo pecado se separou de Deus Pai, caindo em um profundo estado de desumanização. Assim, somente a graça faz com que a humanidade perdida seja re-encontrada por Deus no Reino da Sua Graça.
A mensagem da Graça é a mensagem da aproximação do perfeito com imperfeito, do Santo com o monstro (Monstro é um termo usado por Moltmann para se referir à raça humana), do Amor com o que necessita ser amado. E essa mensagem, explica o relacionamento de Deus com o Homem, não como sendo um relacionamento distante, mas sim, um relacionamento bem próximo, já que Jesus Cristo disse: “... E eis que estou convosco todos os até a consumação dos séculos.” (Mt 28:20; edição revista e atualizada)
Mensagem da Cruz
A mensagem da Cruz é a mensagem do homem diante de si mesmo, já que a cruz revela ao ser humano tudo aquilo que ele realmente é. Moltmann vai dizer que na cruz, Jesus foi abandonado por Deus (Termo usado por Moltmann em seu livro O Deus Crucificado), já que naquele lugar, ele não estava pecando, mas estava se fazendo pecado por toda humanidade. Esse abandono demonstra a insuficiência do homem em seu viver autônomo. O ser humano já não mais pode ser se antes se vê na cruz. A crucificação é um cenário, mas a cruz é o marco de vida; paradoxo entre vida e morte. A mensagem da Cruz é a “nota de rodapé” que mostra ao homem sua vontade de divinização, que é utópica, fazendo-o enxergar sua verdadeira posição diante do Todo Poderoso.
A mensagem da cruz não permite a altivez, a mensagem da cruz não permite a soberba, a mensagem da cruz não permite o orgulho, já que “no caminho da cruz vão ficando para trás os esqueletos do nosso ego” (GUSMÃO, Aziel Miranda. Pregação na Pós-Modernidade. Belo Horizonte: FATE-BH, 8 fev. 2007. Notas de aula), onde Adélia Prado diz que “o ego é aquela parte em nós, que não aceita ser criatura” (Citação feita em um programa televisivo pela poetisa mineira Adélia Prado), já que ser criatura é entender a plenitude da humanidade pessoal contrastando com o desejo egoísta de divinização. A cruz é a barreira contra o desejo de ser Deus, colocado no mundo pela serpente na tentação do Éden ao dizer: “...e sereis semelhante ao Altíssimo...” (Gn 3:5)
Partindo do pressuposto de que ser espiritual é ser cada vez mais humano (Segundo Francis Schaeffer, teólogo do século XX), juntamente com a mensagem da Cruz, que é de reconciliação do homem para com Deus (Jo 3:16), exercer espiritualidade e ser verdadeiramente humano é ser limitado, dependente de Deus e de todos. Assim, é correto afirmar que a Cruz é a aproximação do homem pecador com o Deus Todo Poderoso, do ainda imperfeito com a Perfeição.
A mensagem da Graça
Se a mensagem da cruz permite ao ser humano se conhecer, a mensagem da graça permite ao ser humano conhecer a Deus. Se a mensagem da cruz é o homem diante e si, a mensagem da Graça é o homem diante de Deus. Para se entender a mensagem da Graça, é necessário entender a encarnação do Verbo, a qual possibilitou Deus se manifestar aos homens de forma humana, mostrando o Pai a partir de si. Aquele que era conhecido pela Lei e pelos profetas agora se faz conhecido no Filho e pelo Filho.
A pós-modernidade tem provocado a desencarnação do Verbo (GUSMÃO, Aziel Miranda. A desencarnação do verbo: a influência do secularismo pós-moderno e do novo fundamentalismo na igreja evangélica brasileira. Dissertação (Mestrado em Teologia). Faculdade Evangélica de Teologia de Belo Horizonte, Belo Horizonte. Capa da dissertação), onde pessoas têm vivido completamente distantes de Deus, isso porque Cristo tem sido trocado pelos ares egoístas e pessoais, fazendo com que haja uma descristianização geral, onde Deus é colocado como um objeto a ser apenas pensado e lembrado e festas e datas e comemorações religiosas. A visão de um Deus pessoal deixa de ser possível. A desvalorização de Deus e a supervalorização da Igreja fazem com que a concepção de Deus seja apenas como “o outro”. Abrem-se lugares para que reinados autoritários nas igrejas se façam presente, fazendo com que ao invés de se aproximar de Deus, o homem se afaste dele cada vez mais. O fato de não se valorizar a Graça Divina, mas o próprio homem em suas faculdades faz com que a desumanização aconteça devido à insuficiência da existência do homem quando encerrada em si mesmo.
A Cruz como limite ao homem e a Graça como re-humanização
Entende-se por limite aquilo que separa duas ou mais coisas distintas entre si, impossibilitando as mesmas de continuarem seus percursos. A Cruz é um limite, não apenas no passado como também na pós-modernidade. A Glória de ser ilimitado é somente para o Eterno, o que não é negociável ao homem. Aliás, a falta de limites fez do homem digno do título “pecador” no Éden ao pecar (Gn 3.6ss). A Cruz lembra o homem de sua realidade. A Cruz é o fim de todos os pecadores; exemplo vivido (ou levado à morte?) por Cristo que se fez pecado. Porém, a Graça, que foi outorgada por Cristo na Cruz (Gl 2.21), é re-humanização, pois devolve ao homem a capacidade de ser novamente humano. Humanização só é possível àqueles que se achegam a Deus. E isso só é possível por meio da Graça de Cristo.
A Graça não permite que o homem desumanizado continue sua vida desumana e independente, mas faz com que ele entenda que sua identidade e valor não estão nas suas realizações pessoais e sim em Deus que o restaura nos verdadeiros moldes de ser humano.
Considerações finais
Se na Idade Média o homem já possuía dificuldades de viver tendo Deus como referencial, na modernidade, e mais restritamente na pós-modernidade ficou ainda mais difícil sem considera-lo referencial. Tentativas de se conceber tudo fora das mãos de Deus foram feitas através do crivo da razão, porém esta razão só mostrou o quanto o homem chega a ser irracional em seu raciocínio. O que antes era explicável pela razão e tão somente por esta, agora é substituído pelo desespero, pela falta de identidade e pela depressão existencial, o que agora são razões para se não viver. O que antes possuía cheiro de vida agora tem odor de morte e tudo isso porque aquilo que foi feito à imagem e semelhança de seu criador já não tem mais o desejo de o ser. Por isso, a vida humana não tem mais no que se espelhar.
Após diversas experiências, o que restou ao homem foi reler a mensagem da Cruz e da Graça para que então seu referencial fosse restaurado e novamente valorizado. Para que o homem se sinta humano novamente é preciso que este se veja morto na Cruz e ressurreto na Graça. Sua humanidade só é possível diante disso e principalmente pelo fato de Cristo ter morrido em seu lugar, não só por amor, mas como exemplo a ser seguido. Isso também vale para as próximas gerações, já que a história do homem se resume em erros e acertos, porém este último vem de Deus.
Referências Bibliográficas
ARAÚJO, Caio Fábio de. O enigma da Graça: Comentários ao livro de Jó. São Paulo: Fonte Editorial, 2002.
BÍBLIA SAGRADA, Rev. Atualizada. SBB
CAIRNS, Earle E. O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 1984.
GIBELLINI, Rosino. A Teologia do século XX. São Paulo: Loyola, 1998.
GOMES, Paulo Miranda; MOURA, Nelson de; GONZÁLEZ, Alaíde Inah. História para o curso colegial e exames vestibulares. Belo Horizonte: Editora Pioneira, 1969.
GRENZ, Stanley J. Pós-Modernismo: um guia para entender a filosofia de nosso tempo. São Paulo: Vida Nova, 1997.
GUSMÃO, Aziel Miranda. A desencarnação do verbo: a influência do secularismo pós-moderno e do novo fundamentalismo na igreja evangélica brasileira. Dissertação (Mestrado em Teologia). Faculdade Evangélica de Teologia de Belo Horizonte, Belo Horizonte.
MOLTMANN, Jürgen. El Dios Crucificado: La cruz de Cristo como base y critica de toda Teologia cristiana, trad. Severiano Tavalero Tovar, Salamanca: Sígueme, 1975.
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da Esperança: estudos sobre os fundamentos e as conseqüências de uma escatologia cristã, trad. Helmuth Alfredo Simon, São Paulo: Teológica, 2003.
PELLÁ, Ângelo Virgílio. Tendas e Tabernáculos: Religião e pós-modernidade. São Paulo: Paulinas, 2006.
Muito bom ver vc aki meu mano..saudades....de vcs.
ResponderExcluirAh muito bom o texto...tbm ne so gente boa nisso aki.
Abraços Amiel Abner